IGHB, essa luz não vai se apagar
No artigo, Carlos Pronzato fala sobre o papel histórico e cultural do IGHB e sobre o conflito criado pelo corte de verbas determinado pelo governo da Bahia. Denuncia a ilegalidade da medida, critica o uso político deste bloqueio e defende que a cultura precisa de apoio institucional, independentemente de divergências ideológicas.
Nunca deixo de assistir a palestras e cursos oferecidos pelo Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), situado no coração popular da cidade, bem ao lado da praça da Piedade, aonde foram enforcados os alfaiates e soldados da Conjuração Baiana (1798), o primeiro levante popular negro que pregava pelo fim do escravismo. Justamente de cara aos tenebrosos patíbulos se ergue uma entidade que preserva a história oficial do Estado, do ponto de vista das suas elites (como de fato todos os institutos históricos do país). Mas nem só, tudo pode ser encontrado lá. Também frequento a sua imprescindível Biblioteca Ruy Barbosa, consulto livros raros e jornais do início do século XX ou atuais, faço uma pausa das lides cotidianas, e jogo conversa fora com dedicados funcionários, historiadores, pesquisadores, jornalistas e frequentadores ocasionais.
Há um conflito em curso, que não deveria existir, entre o governo da Bahia e o IGHB por causa do corte de verbas, considerado ilegal pela Justiça com placar de 20 x 0, determinando a reinclusão desta entidade centenária, fundada em 1894, à lista de instituições contempladas com repasses mensais, determinação contestada pelo governo que em março do ano passado cortou a verba, garantida pela Lei nº 6.575/1994, num repasse anual de R$ 700 mil, o que representa 85% do orçamento do Instituto.
Todos conhecem as posições exacerbadamente antipetistas do Presidente do IGHB, o advogado, empresário e conferencista Joaci Góes. Mas isto não pode ser motivo de corte de verbas. O governo não é só o governador, assim como o IGHB não é só Joaci Góes, com quem mantenho um cordial relacionamento, apesar de estar nas antípodas do seu pensamento político. Costumava também, nos fins de tarde, visitar a historiadora Consuelo Pondé de Sena (1934 - 2015) a saudosa presidente no seu gabinete, que não era precisamente uma adepta das teorias socialistas.
Em novembro de 2023, Ernesto Araujo, ex-ministro de Relações Exteriores do governo Bolsonaro, extremista de direita e devoto de teorias conspiratórias, “alguém que insiste em viver à margem da verdade dos fatos” segundo disse a ex-senadora de direita Katia Abreu (PP) em 2021, e que cunhou o delirante termo “nazismo de esquerda”, foi convidado pelo IGHB a palestrar num evento. Convite nefasto. Na ocasião, a Secult disse que não concorda com práticas de fake news.
Mas, apesar de qualquer polêmica política, o governo tem o dever de distribuir os impostos que correspondem à cultura, de forma democrática. Em virtude desta angustiante situação, em setembro, o IGHB lançou a campanha “Não deixe esta luz se apagar” (informações: ighbahia@gmail.com) para preservar um dos maiores tesouros culturais do país.
* Carlos Pronzato é cineasta, diretor teatral, poeta e escritor. Sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB). carlospronzato@gmail.com
